quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Ruas Sustentáveis e Inteligentes


Por Sheila Hempkemeyer,
psicóloga

Tive o prazer e o privilégio de participar do III Fórum Mundial da Bicicleta, ocorrido entre os dias 13 e 17 deste mês em Curitiba. Dentre todas as discussões, aprendizados e ótimos encontros existenciais participei de um painel sobre Urbanismo, com palestrantes estrangeiros que expuseram a realidade em seu país, bem como das iniciativas mundiais sobre o tema. Lars Gemzoe (dinamarquês) palestrou sobre “Porque alguém iria pedalar na cidade?”. Foi consenso entre todos os especialistas que quanto mais ciclistas na rua maior a segurança para os mesmo, consequentemente, maior o incentivo a pedalar.

Gemzoe apresentou o projeto Rua Sustentável em Nova York, que como toda grande cidade tem seu trânsito caótico. Porém o governo local decidiu diminuir (isso mesmo DIMINUIR) o tamanho das duas principais ruas centrais da cidade (Broadway Boulevard e Madison Square) para os carros e, pintou duas pistas de cores diferentes: uma transformou em praça pública com mesas, bancos e vasos decorativos; outra em ciclovia. Ou seja, uma rua onde haviam quatro pistas para carros, restaram somente duas, sendo as outras compartilhadas com as pessoas. Tinta e orientação foram necessários para que as pessoas começassem a ter o hábito de sentar nas praças e tomar um café, ou somente conversar, coisa antes nunca vista em NY. Muitos começaram também a deixar de usar o carro e começaram a andar de bicicleta.

Um grande investimento? Creio que não. Pura e simplesmente vontade política de efetivar o que todos sabemos (ou deveríamos saber): que a cidade é feita para as pessoas e não para os carros. Com isso as pessoas começaram a pedalar na cidade, tornando possível num grande centro comercial mundial aliar transporte sustentável e qualidade de vida para seus habitantes.

E a nossa Blumenau não poderia fazer o mesmo? Ao invés de criar pistas para carros, porque não criar uma rua sustentável semelhante a de NY? Precisamos de ousadia e visão de futuro (não era esse o discurso político nas eleições?!) e é fato que a bicicleta vem cada vez mais querendo seu espaço. Pedalando (saliento meu otimismo) percebo o apoio de muitos motoristas, e também dos colegas elogiando a iniciativa, mesmo que a maioria de nós estejamos exprimidos nas ruas e ciclovias da cidade.

Nova York. Fonte: vaidebici.wordpress.com


Se é algo que veio para ficar e cresce a cada dia é preciso um olhar especial para isso. Governantes, estamos pedalando cada vez mais e queremos nosso espaço por direito. Se NY consegue, porque Blumenau não pode usar um pouco de tinta e ousadia para podermos pedalar na cidade que tanto nos é negada?


Nova York. Fonte: www.mobilize.org.br

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Extra! Extra! Os novos ônibus de Blumenau


Não é piada, não. Saiu no blog do Jaime e estão compartilhando nas redes sociais. Blumenau, um vale quente pra deus do céu e o inferno dos diabos, continua com mandatários que pouco ou nada se importam com o povo que anda de transporte coletivo: estão na iminência de aprovar os novos ônibus pra circular na cidade SEM ar condicionado! E um anônimo coloca indignado seu comentário: ‘tão de brincadeira, né? Quando é que vão botar na cabeça que estão transportando gente?’

Fonte: Blumenau Mil Grau - Facebook
E como rede social é rede, sempre cai mais peixe pra colorir a história: irmão de motorista conta no facebook que os ônibus, quando comprados, já vem com ar condicionado de fábrica, mas mandam tirar quando chegam à cidade.










Isso tudo só me fez lembrar do Brollo... aquele que foi flagrado em certas escutas telefônicas, em palavras impronunciáveis neste 'horário de livre acesso.'  Ou seja, aqui nada muda: nem a forma de governar, nem o povo, pacífico que só. Quem tem mais culpa?







domingo, 23 de fevereiro de 2014

Rua João Pessoa: mortes à vista!


Sally Satler, advogada e ciclista.

Não adianta. Ninguém, mas ninguém vai me convencer a aceitar de cabeça baixa a colocação da terceira pista para carros na Rua João Pessoa, em Blumenau. Se antes o trânsito estava em duas pistas largas, com motoristas trafegando a 30, 40 km/h (velocidade aceitável para o perímetro urbano), é certo que com três pistas e a velocidade aumentando, os atropelamentos, ou melhor, os assassinatos por atropelamento irão acontecer. Porque é impossível ficar tratando como ‘acidente’ as inúmeras mortes por imprudência, excesso de velocidade ou embriaguez ao volante.

Aos que acreditam na promessa de medidas traffic calm naquela via, como travessias elevadas para pedestres, eu pergunto: como podem ser tão ingênuos, se estamos esperando há 4 anos somente a recolocação da fiscalização eletrônica? Se estamos, tão servilmente, só contando nossos mortos na cidade? Queria eu que estivesse errada! Nem mal foi feita a nova pista  e aconteceram choques entre veículos. E já tem apressadinho buzinando e ultrapassando os que ousam andar numa velocidade inferior a 80 km/h, numa via como aquela! Esta nova pista só é aceitável se for para uso de ônibus e ciclistas, com campanhas para educação e respeito mútuos.

A promessa de que após o término das obras de prolongamento da rua Humberto de Campos a terceira pista da rua João Pessoa será desativada chega a ser tragicômica – ninguém, nem o governo sabe quando essa obra vai começar e terminar, pois são mais de 100 desapropriações que precisam ser feitas antes (e pasmem, só uma foi feita até agora).

O governo municipal não está só na contramão da mobilidade sustentável e segura: está nas mãos de alguns poucos ‘donos da cidade e das ruas’. Pesquisem pra saber por que até hoje a Rua Benjamin Constant não possui ciclovia, mesmo tendo projeto de execução há anos amarelando no papel.

Como ciclista, não me sinto mais segura em pedalar na rua João Pessoa. Como pedestre, também. Escrevo por não querer ser conivente com isso, nem com as mortes que virão. E por isso a nossa BICICLETADA[1] de fevereiro (dia 28) tem que acontecer, lá na rua João Pessoa!

Foto: Marcelo Martins

Se uma cidade caótica como Nova York pode, Blumenau também pode, não é utopia! Dêem uma olhada nesse vídeo de 3 minutos:





[1] Bicicletada (ou massa crítica) é um evento que ocorre em mais de 300 cidades ao redor do mundo, geralmente na última sexta-feira do mês - inclusive em Blumenau, com concentração na Praça da Prefeitura, às 18:30h. Ela acontece quando dezenas, centenas ou milhares de ciclistas se reúnem para reivindicar seu espaço nas ruas, lutar por um trânsito mais humano e por um mundo mais respirável. 

* Artigo publicado no Jornal de Santa Catarina e também nos Portais: Controversas, de Blumenau e Desacato, de Florianópolis.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Drones: O céu que nos ‘protege’


O frio de janeiro no inverno europeu não nos impediu de fazer uma das atividades que mais gostamos: caminhar aleatoriamente no sábado de manhã pela cidade, desta vez no centro de Munique. Muita gente estava circulando na Marienplatz, com turistas admirando a Rathaus, antigo prédio da Prefeitura de Munique, e os moradores da cidade entretidos com seus afazeres cotidianos, como as compras no comércio local e na lotada feirinha de frios e temperos ali perto. O imponente relógio apontava 11 horas, hora esperada por muitos: a ‘dança do Glockenspiel’ na torre de 85m, onde 32 bonequinhos encenam batalhas e danças contando a história de Munique.

Ao desviar o olhar para o céu, percebi que não havia somente nuvens e um tímido sol; drones estavam à espreita, a nos vigiar. Minha primeira indagação foi: ‘o que aqueles drones faziam ali?’ Éramos turistas, olhando bonecos de metal dançando ao som de sinos.  Pensei que pudesse ser uma filmagem do departamento de turismo, mas, atenta aos seus movimentos de sobe e desce, observei ‘seu’ interesse naqueles que levavam mochilas nas costas. Teria o drone infravermelho? Ou eram os traços fisionômicos de alguns que despertava o interesse? Quem sabe, um coração acelerado ou um corpo febril? Meses atrás, esse novo tipo de maquininha, controlada à distância por jovens militares estadunidenses, conseguiu identificar um grupo de afegãos numa festa de casamento. Presumindo se tratar de guerrilheiros da Al Qaeda, bastou um clique para lançar uma bomba e aniquilar dezenas, talvez centenas de vidas inocentes. Nessa guerra ‘preventiva’, poucos conseguem perceber que não há vencedores. Há sanguinários e covardes, estes sim terroristas, que sequer ‘perderam tempo’ em justificar um ato tão arbitrário e desumano. Tudo com a nossa complacência!


Drone ao lado da Rathaus -
Prefeitura de Munique/Alemanha

Olhando ao vivo os drones em Munique e não pela tela de uma TV, de tanto misturarem realidade e ficção, obnubilaram nossa crítica sobre os Senhores da Guerra e seus perversos brinquedos. Ao capturá-los pela lente da minha máquina fotográfica, constatei que conseguiram transformar, nós todos, em inimigos e ameaça. Não só de Munique, como naquele momento tão trivial. Mas de tudo e de todos; e também de nós mesmos.
   
E o que podemos fazer diante desse tipo de ‘sociedade malvada’, usando o termo empregado por Leonardo Boff, em que humanos não se tratam mais humanamente e a barbárie corre sem rumo em velocidade galopante? Eu não sei. Mas o primeiro passo é perceber que o nosso aval, apoio e passividade para esse tipo de vigilância e controle, não é o caminho. Não mesmo!


Drone sob o céu de Munique/Alemanha

Texto publicado no Portal Desacato, de Florianópolis e no Blumenews, de Blumenau.